Acerca de mim

Gosto de partilhar os meus conhecimentos com as pessoas, gosto de ter amigos, gosto de estar bem disposta, gosto de estar com a minha família, gosto muito da minha filha Rita

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

zuzu

ZUZU - QUINTAL DE CASA BRANCA

MULHER CONTRA A CORRENTE

Havia em tempos uma mulher tão teimosa, que por birra, meteu-se a uma ribeira, que levava muita água, e não dava passagem. 
Caiu na ribeira, e morreu afogada. 
No dia seguinte andou o marido à procura do cadáver da mulher; em vez, porém, de seguir o leito da ribeira, acompanhando o curso da água, ele procurou o cadáver pela ribeira acima.
 Procura mal o cadáver, — disse-lhe um compadre — pois é natural encontrá-lo lá em baixo.

 Não, compadre, a minha mulher era muito teimosa e mesmo depois de morta é capaz de caminhar contra a maré.

MATA-PIOLHOS

Havia uma mulher que era muito teimosa, e chamava ao homem Mata-Piolhos.
Segue-se que o homem não gostava do nome, e dizia-lhe:
 Mulher, não me chames assim! Mas ela teimava.
Um belo dia, o homem meteu-a num poço, mas ela, enquanto ia pelo poço abaixo, ia dizendo:
 Mata-Piolhos, Mata-Piolhos, Mata-Piolho! 
E o homem sempre a fazê-la escorregar mais para o poço; já lhe ia a água quási no peito, e ela ainda:

 Mata-Piolhos, Mata-Piolhos, Mata-Piolhos! 
Foi mais para baixo, e, quando já lhe chegava a água à boca e não podia falar, então levantou os braços, e só com eles de fora fazia o gesto com as unhas dos dois polegares de quem mata-piolhos.

A MULHER TEIMOSA

Numa aldeia de Barcelos, havia um casal que andava sempre à bulha, porque a mulher era muito teimosa.
Um dia, o homem trouxe para casa um queijo que comprou na vila, e, ao jantar, pô-lo na mesa e pediu à mulher uma faca para o cortar, mas a mulher, em vez de lhe trazer a faca, trouxe-lhe uma tesoura.
 Esta é boa! disse o homem — Como é que eu posso cortar o queijo com a tesoura? Foi coisa que nunca se viu!
 Pois o queijo sempre se cortou com a tesoura — disse a mulher.
 Que disparate! Com a faca é que sempre se cortou.
 Pois é com a tesoura! — teima ela.
—É com a faca, mulher!
E questionaram os dois por algum tempo, até que o homem, farto da teimosia, bateu na mulher, e perguntou em seguida:
 Então é com a faca, ou não?
 É com a tesoura, já disse! — teimou a mulher, apesar da coça que levara.
O homem enfureceu-se tanto, que, perdendo a cabeça, agarrou na mulher e foi a correr deitá-la ao rio, o Cávado por sinal.
A mulher, que não sabia nadar, foi logo ao fundo como um prego, e o homem, ao vê-la desaparecer, ainda lhe disse cá de cima:
 Diz lá agora com que é que se corta o queijo! E viu-se então a mão da mulher aparecer por fora da água e mexer dois dedos, como a dizer que era com a tesoura.

Nem naquela altura deixou de teimar.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

SOLUÇÕES DAS ADIVINHAS

1- O bule  / 2-  O alho/ 3- As gotas da chuva / 4- A balança /
 5- Quando estiver vazia / 6- Telefone / 7- A Música / 8- Olhos /
9- O relógio / 10- Carta / 11-A minhoca / 12-  Os dias da semana /
13-A chuva / 14- O alho / 15-Tu tens muitos problemas! /
16- O meio / 17- A letra B. / 18- O céu da boca./ 19 ?????. /
 20- A fechadura./ 

ADIVINHAS

Adivinhas

     1- O que é o que é, tem chapéu, mas não tem cabeça, tem boca mas não fala, tem asas mas não voa?
2 - Tem cabeça, tem dentes, tem barba, não é bicho nem é gente, o que é?

3-  O que é que cai de pé e corre deitado?

4-  Mantém sempre o mesmo tamanho, independentemente do peso?

5 - Quando será que se pode entrar sem perigo na jaula de um leão?

6 - O que será, que será, que fala e ouve, mas não é gente?

7- Qual é coisa, qual é ela, que põe o mundo a dançar, tem notas e não é dinheiro?

8- Altos castelos, lindas janelas, abrem e fecham, ninguém mora nelas.

9- Qual é coisa, qual é ela, que tem uma perna mais comprida que a outra e noite e dia anda sem parar?

10- Branca como a neve, preta como a paz, fala e não tem boca. Ainda não tem pés.

11- Qual é o bicho qual é, sem osso nem espinha?

12- O que será, que será que são sete e são irmãos. Cinco vão à feira e só dois é que não?

13- Qual é coisa, qual é ela, que cai de muito alto mas nunca se aleija?

14- Qual é coisa, qual é ela, que tem cabeça mas não é gente, e tem dente, mas não é pente?

15- O que será, que será, que o livro de Português disse ao livro de Matemática?

16- Qual é coisa, qual é ela, que nunca está no princípio e nunca está no fim?

17- O que é que é pequeno em Lisboa, e grande no Brasil?

18- Qual é o céu que não possui estrelas?

19- Sou mais vasto do que o mar e ninguém me pode ver; Todo o mundo é meu lar, sem mim não podes viver.

20- Qual é coisa, qual é ela, que atravessa todas as portas sem nunca entrar nem sair por elas?

BELA E A COBRA

Era uma vez um rei que tinha três filhas, uma das quais era muito formosa e ao mesmo tempo dotada de boas qualidades. Chamava-se Bela. O rei tinha sido muito rico, mas, por causa de um naufrágio, ficou completamente pobre.
Um dia foi fazer uma viagem; antes porém perguntou às filhas o que queriam que ele lhes trouxesse.
A mais velha disse-lhe:  – Eu quero um vestido e um chapéu de seda.
A do meio disse: – Eu quero um guarda-sol de cetim.
– E tu que queres? – perguntou o pai  à filha mais nova.
– Uma rosa tão linda como eu, respondeu ela.
– Pois sim, disse ele.
E partiu.
Passado algum tempo trouxe as prendas das suas filhas, disse à mais nova:
– Pega lá esta linda rosa. Bem cara me ficou ela!
Bela ficou muito preocupada e perguntou ao pai por que é que lhe tinha dito aquilo. Ele, a princípio, não lho queria dizer, mas ela tantas instâncias fez, que ele lhe respondeu que no jardim onde tinha colhido aquela rosa encontrou uma cobra, que lhe perguntou para quem era a rosa; então ele tinha-lhe respondido que era para a sua filha mais nova: A cobra disse-lhe que ele tinha que lhe levar a rapariga, se não, ele seria um homem morto.
A rapariga ao ouvir isto disse-lhe: – Meu pai, não tenha pena, que eu vou.
Assim foi. Logo que ela entrou naquele palácio, ficou admirada de ver tudo tão asseado, mas ia com muito medo. O pai esteve lá pouco de tempo e depois foi-se embora. Bela, quando ficou só, foi a uma sala e viu a cobra. Ia-se a deitar quando começaram a ajudarem-na a despir. Estava ela na cama quando sentiu uma coisa fria; ela assustou-se e deu um grito e disse-lhe uma voz: – Não tenhas medo.
Em seguida, foi ver o que era e apareceu-lhe uma cobra. Ela, a princípio, assustou-se, mas depois começou a afagá-la. Ao outro dia de manhã,  apareceu-lhe a mesa posta com o almoço. Ao jantar viu pôr a mesa, mas não viu ninguém; a noite foi-se deitar e encontrou a mesma cobra. Assim viveu durante muito tempo, até que um dia foi visitar o pai; mas quando ia a sair ouviu uma voz que lhe disse: – Não te demores acima de três dias, senão morrerás.
Ia a continuar o seu caminho e já se tinha esquecido do que a voz lhe tinha dito. Chegou a casa do pai. Já iam a passar os três dias, quando Bela se lembrou que tinha de voltar para o palácio; despediu-se de toda a sua família e partiu montada no seu cavalo; chegou lá à noite, foi-se deitar, como era hábito, mas já não sentiu o tal bichinho dentro dos lençóis. Cheia de tristeza, levantou-se pela manhã muito cedo, foi procurá-lo no jardim e qual não foi a sua admiração vendo-o no fundo dum tanque, com muita dificuldade para respirar! Ela começou a afagar a cobra,  chorando; mas, quando chorava, caiu-lhe uma lágrima no peito da cobra; assim que a lágrima lhe caiu em cima do peito, a cobra transformou-se num príncipe, que ao mesmo tempo lhe disse: – Só tu, minha donzela, me podias salvar! Estou aqui há uns poucos de anos e, se tu não chorasses sobre o meu peito, ainda aqui estaria cem anos mais.

O príncipe gostou tanto dela que casou com ela e lá viveram durante muitos anos.

FIM

GUIMI E GUIOMAR


GUIMI E GUIOMAR


         Era uma vez um homem muito pobrezinho e que tinha uma filha tão bonita como bondosa. Viviam num pobre casebre lá no meio da floresta. O homem era lenhador, e vivia de carradas de lenha que apanhava na floresta e depois vendia na cidade. Ora, numa dessas voltas pela floresta, já no regresso a casa com a carroça carregada de lenha, ao passar um ribeirinho, enterra-se a carrada na lama, e como os animais já eram muito velhotes já não tinham forças para puxar o carro e tirá-lo do atoleiro,  o homenzinho começou a dizer:
         – Ai valha-me Deus! Valha-me Deus! Valha-me Deus que a minha carrada de lenha não se tira da lama!
         Tanto pediu por Deus, tanto pediu que, ao ver que este não lhe acudia nas suas aflições, zangou-se e disse então:
         – Ora!... Valha-me o Diabo!...
         Assim que acabou de dizer isso, apareceu-lhe logo o Diabo, que lhe perguntou:
         – Chamaste-me? E porque é que precisas de mim?
         – Chamei sim! – disse o homem muito receoso – É que tenho aqui a minha carrada de lenha atolada na lama e não a consigo tirar. E uma vez que Deus não me acudia, chamei então pelo senhor Diabo.
         – Então olha! – disse-lhe o Diabo – Eu tiro-te a carrada da lama mas só com a condição de me dares o primeiro ser vivo que vier ao teu encontro ao chegares a casa.
         O homenzinho pensou para consigo:
         – Oh! O que vem sempre primeiro ter comigo quando chego a casa é o cão... Está bem! Está combinado! – disse para o Diabo.
         E o Diabo, depois de, por artes mágicas, ter tirado a carrada da lama ao lenhador, abalou todo satisfeito.
         E o lenhador, também todo contente, ia pensando para consigo:
         – Ora, pensas-te esperto, mas desta vez foste levado!...
         E dito isto, lá foi andando, a caminho de casa porque era já quase sol-posto, e na floresta ao sol-posto é praticamente de noite. Quando chegou quase à vista da sua casa, com grande espanto viu vir ao seu encontro a sua filha, Guiomar, e não o cão como era costume todos os dias. A filha já vinha em cuidado porque o pai estava a demorar-se mais do que o hábito, com a carrada da lenha da floresta. E o pai, ficou muito aflito e muito triste, e contou-lhe:
         – Oh! filha, então tu logo vieste hoje ter comigo e eu prometi isto assim e assim ao Diabo!...
         E diz-lhe ela:
         – Ora deixe meu pai, não se preocupe, a esta hora já ele se esqueceu com certeza e nunca mais se irá lembrar disso. Deixe lá e não se apoquente, que ele vai esquecer-se...
         Bem, o pobre homem conformou-se e lá foi para casa, disposto a esquecer-se do que tinha acontecido.
         Passados uns dias, já ele não se lembrava do que lhe tinha sucedido, aparece-lhe novamente o Diabo na floresta a perguntar-lhe se ele sempre cumpria a promessa que lhe tinha feito.
         O homem, coitado, todo aflito lá foi para casa e disse à filha:
         – Oh filha, então o Diabo não veio ter comigo outra vez?!... E quer que tu vás para casa dele!...
         – Ora deixe meu pai, agora vou, e depois, em podendo, fujo e venho cá para casa do pai outra vez.
         E vai daí, o bom do lenhador teve de ir levar a filha à casa do Diabo. Foi levá-la, e ela lá ficou...

         E durante muitos anos ficou a Guiomar vivendo na companhia do Diabo. Este tinha duas filhas, tão más como ele e elas sabiam de artes mágicas que trataram de ensinar a Guiomar.
         Ora, um certo dia, foram todas três tomar banho a uma lagoa, lá no meio do campo, como faziam muitas vezes. E iam para a lagoa transformadas em pombinhas, e uma vez lá transformavam-se novamente em meninas para poderem tomar banho.
         E chegaram junto da água, transformaram-se em raparigas e começaram a brincar e a tomar banho todas satisfeitas. Estavam elas numa grande algazarra que nem deram pela aproximação cuidada de um Príncipe que andava a caçar, e se tinha desviado um pouco mais do seu caminho habitual. Assim que viu as três moças lá na lagoa ficou encantado com a Guiomar, e então o que fez ele? Vá de esconder a roupa dela. As meninas quando acabaram o banho e se vinham vestir as três, deram conta da falta das roupas da Guiomar. E ela ficou toda atrapalhada:
         – Ai, então a minha roupa? O que é feito dela?
         Nisto, o rapaz que estava escondido a observar a cena, disse em voz alta:
         – Está aqui!
         As outras raparigas assustaram-se e abalaram logo transformadas em pombas. Mas Guiomar não poderia transformar-se em pomba enquanto não tivesse a roupa. E então, o Príncipe, vendo-a grande atrapalhação da menina, disse-lhe calmamente:
         – Então fique aí atrás dessa pedra, que eu dou-lhe a roupa.
         E assim foi, e a menina vestiu-se e perguntou-lhe quem era e o que fazia ali, concerteza tão longe de casa.
         E ele respondeu-lhe que era o Príncipe Guimi e que andava à caça, e que tinha gostado muito dela e que queria casar-se com ela, se fosse do seu agrado. E ela respondeu-lhe que não podia casar com ele porque estava em casa do Diabo e contou-lhe a história do pai e da carrada de lenha e de tudo o que daí tinha sucedido de seguida. Respondeu-lhe ele:
         – E então como é que eu agora vou conseguir salvar-te da casa do Diabo?
         Respondeu-lhe Guiomar:
         – Olha, tu vais lá, à casa do Diabo e dizes que queres casar comigo, mas ele vai dificultar-te a coisa com certeza. E então tu, quando estiveres aflito, chamas por Guiomar: “Valha-me a Guiomar!”, deixa que eu logo apareço.
         E assim foi. Ele foi-se embora, e ela abalou também, transformada em pomba, abalou e ele foi lá ter a casa do Diabo para lhe dizer que gostava de casar com a Guiomar.
         Respondeu-lhe o Diabo:
         –Está bem, mas com uma condição: eu agora dou-te este saco de trigo e tu vais ao campo semeá-lo, ceifá-lo, debulhá-lo, e levá-lo a um moinho. E depois tens que fazer um moinho, moer o trigo, cozer o pão e ainda hoje à noite eu quero comer desse pão!
         Responde-lhe o príncipe assim:
         – Ah! Senhor, mas isso é impossível.
         – Não sei!... Só assim é que te dou a mão da minha filha. E agora podes ir embora. – Disse-lhe o Diabo.
         E ele abalou e foi para o campo, sentou-se numa pedra e começou a chorar:
         ­– Ah, que triste vida a minha, nunca irei conseguir casar-me com a Guiomar.
         E às tantas lembra-se das palavras da menina e diz:
         – Valha-me a Guiomar!
         E ela apareceu-lhe logo.
         – Então o que foi?
         E lá lhe esteve ele a contar o que tinha sucedido. Esteve-lhe a contar o que o Diabo lhe tinha dito. Tinha que fazer aquelas coisas todas ao trigo até levar o pão para o Diabo comer.
         Ela diz-lhe assim:
         – Deixa lá! Encosta lá a cabeça aqui no meu colo e dorme, e deixa o caso comigo.
         E ele assim fez: encostou a cabeça ao colo dela, deixou-se dormir e lá para as tantas ela acordou-o e disse-lhe:
         – Olha, já podes ir levar o pão ao meu pai, já aqui está.
         Bem, ele lá foi todo satisfeito, chegou lá a casa do Diabo e disse-lhe:
         – Olhe, já aqui está o pão que o Senhor Diabo pediu, para fazer do trigo, semear, ceifar, moer, cozer... já aqui está!
         – Hum! Cheira-me aqui a obra de Guiomar! – disse o Diabo.
         – Ah! Não, Senhor Diabo! Nem eu conheço a Guiomar nem a Guiomar me conhece a mim! – respondeu o Príncipe.
         – Bem! Nesse caso ainda há outra prova para fazeres: agora vais ao campo, lá a uma quinta que eu tenho, abres um poço e hoje ainda quero beber água desse poço. – voltou a dizer o Diabo para ver se o rapaz desistia.
         E lá abalou outra vez o Príncipe de orelha murcha. Abalou para lá e começou novamente a lamentar-se mas já não chorou. Chamou logo pela Guiomar:
         – Valha-me a Guiomar!
         E a Guiomar apareceu-lhe logo.
         – Então agora é o quê? – pergunta-lhe ela.
         – Olha, agora quer que eu vá fazer um poço. Abrir o buraco, fazer o bordo e ainda quer hoje à noite beber água fresca do poço. – conta-lhe o Príncipe.
         – Está bem, olha, faz o mesmo, deitas-te aqui no chão, encostas a cabeça ao meu colo e deixa o caso comigo. – disse-lhe Guiomar.
         E ele assim fez. Passado tempo diz-lhe ela assim:
         – Vá, podes acordar e toma já aqui a bilha, que é para levares a água fresca ao meu pai.

         E ele assim fez. Tirou a água do poço, encheu a bilha e lá foi levar a água ao Diabo, à noitinha.
         O rapaz chegou-se ao pé do Diabo e disse-lhe:
         – Olhe, Senhor Diabo, aqui está a água que me pediu esta manhã.
         – Hum! Aqui anda obra de Guiomar. – resmungou o Diabo.
         E apressou-se a responder o rapaz:
         – Ó Senhor, já lhe disse, nem eu conheço a Guiomar, nem a Guiomar me conhece a mim.
         O Diabo, muito desconfiado, volta-se para o Príncipe e diz-lhe:
         – Bem, ainda falta outra prova. A o fim das três provas então é que pode ser que te dê a Guiomar.
         – Então diga lá qual é a outra prova que falta. – respondeu já mais afoito o rapaz.
         E começa o Diabo:
         – Olha, tens aqui este cacho de uvas. Levas este cacho de uvas e hás-de comer o cacho, semeias as uvas e quero a vinha a crescer, semeada, crescida e depois, com as uvas feitas, fazes o vinho e hoje ao jantar ainda quero beber desse vinho.
         – Ó Senhor Diabo, isso é que eu não consigo concerteza.
         – Não sei, – responde-lhe o Diabo – ou fazes isso, ou então ficas sem a Guiomar.
         E o bom do rapaz foi outra vez para o campo e chegou lá, chamou logo a Guiomar. E depois esteve-lhe a explicar o que é que o Diabo queria que ele fizesse.
         No fim, diz-lhe ela assim:
         – Bem, faz o mesmo que das outras vezes e deixa o caso comigo.
         Deitou outra vez a cabeça no colo dela, e ela ao fim de um tanto tempo, disse-lhe assim:
         – Pronto! Aqui tens esta garrafa, vai enchê-la, porque já está o vinho feito.
         E ele assim fez. Encheu a garrafa, e à noitinha foi levá-la ao Diabo. Este ficou todo zangado, e gritou-lhe:
         – Olha, eu já ando desconfiado que isso não são coisas tuas. São coisas da Guiomar!
         E o rapaz volta a dizer-lhe:
         – Ó Senhor, não Senhor Diabo, nem eu conheço Guiomar, nem Guiomar me conhece a mim. Isto fui eu que fiz.
         – Então está bem – responde-lhe o Diabo –, amanhã de manhã vem cá que é para escolheres das minhas três filhas, uma.
         – Ah, mas eu quero é a Guiomar – diz-lhe o rapaz aflito.
         – Só te dou aquela cujo dedo tu escolheres e que aparecer pelo buraco da fechadura. Aquela que tu escolheres é que casará contigo.
         E o príncipe foi logo dizer à Guiomar o que o Diabo lhe tinha dito. E ela disse-lhe:
         – Olha, não te apoquentes. Aquele dedo que tiver uma pintinha de sangue, é o meu dedo e esse tu o escolherás. E assim, escolhes-me a mim.
         E ela assim fez. O Diabo pôs os dedos das suas três filhas, à vez, no buraco da fechadura da porta, que era para ele escolher uma das três. E Guiomar pôs uma pintinha de sangue no seu dedo. E o príncipe escolheu o dedo da pinta de sangue, escolheu a Guiomar.
         O Diabo ficou ainda mais zangado e disse-lhe:
         – Amanhã de madrugada vem cá que eu dou-ta. Eu dou-te a Guiomar para tu a levares.
         E o rapaz foi contar à Guiomar tudo o que tinha acontecido. E Guiomar disse-lhe:
         – Olha, o Diabo não me vai dar, vai-te dar uma das filhas dele, mas nós fugimos antes dele acordar.
         E combinaram encontrar-se de madrugada.
         E diz o Príncipe à menina quando se encontram:
         – Ele agora está a dormir e nós como vamos fugir, sem ele dar por isso?
         E responde-lhe Guiomar:
         – Tu vais às cavalariças buscar um cavalo. Mas olha, estão lá dois cavalos: um que corre como o vento e outro que corre como o pensamento. E tu trazes o mais magro, que é o que corre como o pensamento. Percebeste bem? Olha que é o segundo cavalo. O segundo é que tu trazes.
         – Está bem, eu vou já buscá-lo. – Respondeu o Príncipe.
         E ele foi. Foi à cavalariça e, quando entra os cavalos começaram a misturar-se uns com os outros, muito espantados de o ver lá, porque não o conheciam. E ele apanhou um cavalo e levou-o para junto da Guiomar.
         E diz-lhe ela:
         – Ah, que não é este cavalo o que deverias ter trazido!...
         E disse outra vez para o rapaz:
         – Olha, vai lá outra vez às cavalariças e traz o cavalo mais magrinho que lá esteja. Não te esqueças que é o mais magrinho.
         E ele respondeu-lhe:
         – Está bem. Está bem.
         E lá foi novamente para junto dos cavalos. Ao chagar lá, viu o cavalo mais magrinho, mas achou-o tão magrinho e viu o outro tão bom, que escolheu o outro e, não fazendo caso da recomendação de Guiomar, escolheu o cavalo mais forte.
         E quando chegou ao pé de Guiomar ela disse-lhe assim:
         – Então eu não te disse para trazeres o mais magro?
         – Ah, mas o outro era tão magrinho que concerteza não podia com a gente os dois. – responde o Príncipe.
         – Podia muito bem sim senhor. Esse é que é o mais leve e mais rápido que o pensamento. Deixa, olha, agora já não temos tempo para o ir trocar, porque o meu pai está a levantar-se. Agora já não temos tempo, e vamos já correndo com este. – Resolveu a menina.
         Montaram-se os dois no cavalo e lá foram correndo, correndo como o vento. Quando iam já lá muito longe, diz Guiomar assim:
         – Ai, que lá vem o Diabo. Já ouço o seu cavalo!
         – E agora o que havemos de fazer? – pergunta o Príncipe.
         E diz-lhe Guiomar:
         – Olha, desce-te já. O cavalo faz-se num rio, eu faço-me no barco e tu fazes-te no barqueiro. E quando o meu pai te perguntar se viste alguém passar por aqui, tu fazes-te desentendido, está bem?
         E assim fizeram. E quando eles acabaram de fazer isso, aparece o Diabo. E diz assim para o barqueiro:
         – Ó senhor barqueiro, viu passar por aqui uma menina num cavalo e um homem também montado no cavalo?
         E responde-lhe o barqueiro, fingindo-se desentendido:
         – Então, se quiser passar, passe. Cada passagem é um vintém.
         – Não senhor. Não foi isso que eu perguntei. – diz-lhe o Diabo. – O que eu queria saber  era se tinha passado por aqui uma menina num cavalo e um homem também montado no cavalo?
         E responde-lhe o Príncipe, disfarçado em barqueiro:
         – Já lhe disse. E o cavalo também pode passar. Cabe tudo no barco. É um vintém cada um.
         E o Diabo, já zangado com as respostas, grita para o barqueiro:
         – Não é isso o que eu quero saber. Olhe, o senhor está mas é maluco e eu vou-me já embora...
         E então lá abalou o Diabo. E assim que ele desapareceu lá ao longe, eles desfizeram-se outra vez em cavalo, cavaleiro e cavaleira e lá foram correndo outra vez, correndo, correndo, correndo... E lá muito adiante, diz outra vez Guiomar:
         – Ai, que aí vem outra vez o Diabo. Já o estou a sentir lá ao fundo. E vá de se desmontarem outra vez. E o Príncipe fez-se desta vez em hortelão, o cavalo fez-se em horta e Guiomar fez-se nas hortaliças. E chega lá o Diabo ao pé do hortelão e disse-lhe assim:
         – Ó senhor hortelão, viu passar por aqui um cavalo com uma menina e um homem montados?
         E responde-lhe o rapaz:
         – Sim, Senhor, tenho cebolas, tenho couves, tenho alfaces... tenho de tudo.
         – Não é isso que eu quero saber. O que eu quero saber é se viu passar por aqui um cavalo com uma menina e um homem montados?! – perguntou outra vez o Diabo.
         E de novo o rapaz, feito em hortelão, lhe responde:
         – Sim, Senhor, as couves são a tanto, os repolhos a tanto, as cenouras são outro tanto, cada coisa tem o seu preço. E olhe que são todos fresquinhos, acabados de colher.
         E o Diabo cada vez mais zangado diz-lhe:
         – Não é isso que eu lhe quero perguntar, o que eu queria saber era se tinha passado por aqui um cavalo com uma menina e um homem montados?!
         E o Príncipe, outra vez:
         – Olhe, já lhe disse, se o Senhor quiser levar a hortaliça, leva, se não quiser, não leva. O preço foi o que eu lhe disse.
         E o Diabo já nem lhe disse nada, de tão fulo que estava. Voltou-lhe as costas e foi-se embora.
         Assim que ele abalou, Guimi e Guiomar voltaram a montar no cavalo e lá foram outra vez correndo, correndo, correndo o mais que podiam. Mas o Diabo tinha o cavalo que corria como o pensamento, corria muito mais depressa do que o deles. E quando lá chegaram mais à frente, diz Guiomar assim:
         – Ai, aí vem ele outra vez, o Diabo.
         Vá de se desmontarem outra vez e transformaram-se novamente: o cavalo fez-se numa igreja, o Príncipe fez-se em sacristão e a Guiomar em santa do altar. E quando chegou lá o Diabo, perguntou ao sacristão:
         – Então o Senhor não viu por aqui passar um cavalo com uma menina e um homem montados?!
         Responde-lhe o sacristão:
         – Olhe, a missa é às dez horas.
         E o Diabo diz-lhe:
         – Não é isso o que eu lhe estou a perguntar. Eu estou-lhe é a perguntar se não passou por aqui um cavalo com uma menina e um homem montados?!
         E diz-lhe o sacristão:
         – Olhe, eu não sei o que o Senhor está para aí a dizer, mas vá perguntar à santa do altar porque pode ser que ela lhe saiba dizer qualquer coisa.
         E o Diabo, muito contrariado, assim fez. Aproximou-se do altar, olhou para a santa e perguntou-lhe:
         – Olhe lá, vossemecê não terá dado conta de passarem por aqui um cavalo com uma menina e um homem montados?!
         Guiomar que já estava à espera, pega na caldeirinha de água benta e salpica-o com uma boa porção.
         O Diabo que não estava à espera disso dá um grande estouro e desaparece sem deixar rasto e nunca mais ouviram falar dele naquelas redondezas.
         Depois de se terem transformado novamente em Guimi e Guiomar, os dois foram buscar o pai de Guiomar que ainda morava na casinha da floresta, e depois foram todos para o reino do Príncipe onde viveram muito felizes muitos e muitos anos.
          

[Rui Arimateia, recolha da Tradição Oral do Alentejo, em Casa Branca, Sousel]
        

           

           
             
           
           

            

GRAÇAS A DEUS PARA SEMPRE...

“GRAÇAS A DEUS PARA SEMPRE,
TENHO A BARRIGA CHEIA E TODA A MINHA GENTE”
Havia n’outro tempo um homem muito ruim para a mulher e para os filhos, e por isso  fazia-os passar fomes, batia-lhes, não falava com eles, enfim, a pobre mulher vivia num tormento constante.
Tinha ele, por costume, ser o primeiro que aviava o seu prato, com pouca comida, e principiava logo a comer, de maneira que quando a mulher estava a aviar o prato do terceiro ou do quarto filho, já ele tinha acabado, e então tirava a saladeira que tinha o resto do jantar, e guardava-a no armário, e dizia à maneira de graça:
“Graça a Deus para sempre,
Tenho a barriga cheia e toda a minha gente”
A mulher coitadinha tinha que comer só pão, para que os filhos comessem o que ela tinha podido tirar da saladeira, mas que era pouco para tantos. E ele, como naquela altura, tinha comido pouco, depois vinha comer sozinho o resto  da comida que estava na saladeira  guardada no armário. Assim sucedia todos os dias e a todas as refeições, a mulher e os filhos andavam sempre com fome.
Um dia apareceu lá em casa um compadre a quem a mulher cheia de desgosto contou o que o marido lhe fazia e a má vida que lhe dava devido ao seu mau génio.
O compadre teve muita dó dela e dos filhos e prometeu-lhe que o havia de ensinar a ser bom marido e bom pai.
Veio depois o marido e fez muitas festas ao compadre, convidando-o para ficar em sua casa, etc. etc...
Chegou a hora do jantar e o dono da casa fez o mesmo do costume; mas quando ia tirar a saladeira para a ir guardar, depois de dizer a oração do costume:
 “Graça a Deus para sempre,
Tenho a barriga cheia e toda a minha gente”
diz-lhe o compadre: “Espere lá compadre, se vossemecê tem a barriga cheia, a minha e a das crianças estão despejadas; e como vossemecê me convidou para   ficar na sua casa, não há-de ser para eu passar fome!”
O outro envergonhou-se de voltar a sentar-se à mesa, e foi para o trabalho, e o compadre, a mulher e os filhos comeram a fartar.
Depois disse para a comadre: -“ Hoje, vossemecê não faça ceia, deixe o resto  por minha conta!”
Chegou a noite. A mulher não falava em ceia e depois de terem estado um bocado sentados à lareira a conversar, foram-se todos deitar, mas no meio da noite, o dono da casa  que não conseguia dormir com tanta fome, acordou a mulher e disse-lhe:
 - “ Oh mulher, p'lamórdeus, vai-me fazer alguma coisa para comer, que não posso estar com tanta fome!”
-“Ai home, o que te posso fazer a estas horas?”
-“ Faz-me umas papas!”
Levantou-se a pobre mulher, reavivou o lume e pôs o tacho com a água ao lume a ferver com a farinha, mas quando as papas estavam quase prontas, o compadre que tinha ficado na cozinha “para dormir mais quente” atira com as meias sujas lá para dentro do tacho, que estava mal seguro na trempe, tombou e entornaram-se as papas.
-“ Ai compadre que me desgraçou” – disse a comadre
-“Então a comadre não estava a fazer a barrela?”
-“Não senhor, eram as papas para o meu marido que está cheio de fome! Então o que lhe hei-de agora dizer?”
-“Ora, conte-lhe o meu engano!”
A mulher foi para o quarto contar ao marido o que se passou, mas ele que tinha muita fome diz-lhe: -“ Oh mulher, tem paciência, vai fazer-me um bolo da amassadura, e coze-o no borralho.”
-“Ora como é que eu hei-de fazer isso, se o nosso compadre está lá na cozinha e se me vê ao lume faz-me alguma pirraça!”
-“Anda lá, vai experimentar!”
A mulher fez o bolo e foi cozê-lo;  mas o compadre assim que a viu, veio assentar-se ao lume, dizendo que não podia dormir com frio e pegando na tenaz, diz-lhe:
-“ Agora vou contar-lhe a minha história!Olhe comadre o meu pai era rico, mas nós quando ele morreu éramos 14 irmãos, de maneira que teve de entrar a justiça em casa por causa das partilhas. Que desgraça nos sucedeu, minha comadre! Foi tudo dividido assim, bocado a um, bocado a outro; a um as panelas, a outro os tachos, a outro os pratos, por fim era já tão grande a barafunda , que cada um tirava o que podia”
E a cada quinhão  de que falava fazia um risco fundo com a tenaz no bolo. O bolo ficou todo sujo de cinza que era impossível de se comer!
A pobre mulher, por mais que tentasse que ele não estragasse o bolo, não conseguiu nada, porque ele estava muito entusiasmado a fazer os quinhões, e quando viu o estado em que ele pôs o bolo disse:  - “Ai compadre da minha alma! Que era um bolo para o meu marido!”
-“Ai comadre porque não mo disse, e eu julgava que era o formento que vossemecê estava a fazer!”
-“Então agora o que lhe hei-de eu dizer?”
-“Ora, diga-lhe que se deixou dormir, e que o gato o comeu!””
A mulher foi-lhe dizer isso. O marido ficou desesperado, e como não podia ficar assim, resolveu pôr às costas a albarda da burra e ir para o faval, comer favas cruas. Assim fez. Mas o compadre que o sentiu sair, pega numa espingarda e vai atrás dele, e quando o apanhou a comer as favas, dá um tiro para o ar. O homem assim que ouviu o tiro, começou a gritar: - “ Oh compadre não atire que sou eu!”
O outro fez-se muito admirado e perguntou-lhe o que estava ali a fazer coberto com a albarda do burro. Que ele tinha disparado pensando que era uma raposa que estivesse a comer as favas.
-“ É que como ontem não jantei como é costume e nem ceei, não posso dormir com fome, e vossemecê tem estragado o que a minha mulher tem ido fazer para eu comer, e por isso me vi obrigado a vir comer favas!”
-“ Ora muito bem, pois isso que eu lhe fiz hoje, foi para o compadre avaliar o que a sua mulher e os seus filhos passam com a sua maldade de os fazer passar fome. Agora que já sabe o que isso custa, deve emendar-se e deixar que a sua família encha a barriga.”
O homem aprendeu a lição, e daí em diante, comiam todos a satisfazer-se, e ele já não dizia:
“Graças a Deus para sempre,
Tenho a barriga cheia e toda a minha gente.”

FIM



Revista “ A Tradição”   Anos IV a VI  1902-1904 ( Pág 141)