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Gosto de partilhar os meus conhecimentos com as pessoas, gosto de ter amigos, gosto de estar bem disposta, gosto de estar com a minha família, gosto muito da minha filha Rita

quarta-feira, 12 de março de 2014

AS TÚNICAS DE URTIGA


Numa terra muito distante, havia um rei bondoso e sábio, que tinha uma linda filha, chamada Lúcia e onze filhos, todos belos e inteligentes. O soberano, que já estava velho e cansado, amava ternamente sua esposa e seus filhos.
Infelizmente, a rainha morreu, e o rei, sentindo-se triste e solitário, resolveu casar-se com a viúva de seu primo, que tinha sido o soberano de um país vizinho.
A felicidade, que até então reinava no palácio, desapareceu. A nova rainha, que era uma feiticeira perversa, conseguiu dominar o velho rei. A primeira coisa que ela fêz foi afastar Lúcia do palácio, mandando-a para a casa de uns lenhadores, que moravam numa floresta longínqua.
Quanto aos onze príncipes, tantas mentiras a bruxa pregou a seu respeito, que o rei acabou não os querendo mais ver. Então, a feiticeira resolveu encantar os meninos. Depois de fazer uma porção de gestos mágicos, disse para os príncipes:
Voai, ligeiros, longe de nós, Jazei-vos aves, aves sem voz!
Os meninos transformaram-se em cisnes brancos e saíram voando pelo céu afora. Eles deviam seguir para um lugar determinado pela bruxa. Durante a viagem, procuraram passar sobre a casinha da floresta, onde estava a irmãzinha. Mas já anoitecia. Por isso, embora tivessem batido as asas com força, não conseguiram acordá-la.
Quando Lúcia completou quinze anos, teve permissão para ir ao palácio. Assim que a rainha a viu, ficou louca de inveja e de raiva. A menina era de uma beleza deslumbrante. A bruxa quis transformá-la logo em cisne, e só não o fez porque o rei desejava vê-la. Resolveu esperar uma ocasião mais oportuna para lhe fazer mal.
Lúcia costumava nadar no lago que havia junto ao palácio. Um dia, antes de ela chegar ao lago, para lá se dirigiu a rainha, levando consigo três sapos horríveis.


Na margem do lago, atirou o primeiro sapo na água, dizendo: Quando Lúcia estiver nadando, salta na sua cabeça, para fazê-la tão estúpida como tu!
Quando atirou o segundo, berrou: Salta no rosto de Lúcia, para fazê-la tão feia como tu!
E, quando atirou o terceiro, rosnou: — Fica perto do coração de Lúcia, para que se torne perversa e má!
Os sapos fizeram tudo o que a rainha ordenou. Quando a moça saiu do lago, mais parecia um bicho que um ser humano. Ao vê-la, o rei ficou horrorizado. E mandou que ela voltasse para a floresta.
É bom lembrar que Lúcia ficou muito feia, mas não se tornou má. O sapo não conseguiu modificar seu coração bondoso. Tendo sido desprezada pelo seu pai, a jovem resolveu sair à procura dos seus queridos irmãos.
Viajou dias e dias, atravessando montes, vales e cidades. Durante a viagem, encontrou, numa floresta, uma velha faminta que lhe pediu um pedaço de pão. Lúcia deu-lhe pão, com prazer, e ainda foi apanhar, no riacho, um pouco de água para matar a sede da velhinha.
Esta, que era Nossa Senhora disfarçada, mandou que Lúcia comesse uma frutinha silvestre que crescia à beira do ribeiro. A moça obedeceu e, no mesmo instante, desencantou-se, voltando à sua beleza natural.
Lúcia continuou a viagem. No meio do caminho, encontrou um velhinho a quem deu o seu último pedaço de pão. Perguntou-lhe, então, se tinha visto onze príncipes tão belos como o sol. O velho respondeu: — Que coincidência! Não vi os onze príncipes. Mas vi onze cisnes belíssimos, cada qual com uma coroa na cabeça!
E mostrou o lugar onde vira as lindas aves. A princesa seguiu para lá, sentou-se e ficou à espera o dia inteiro. Quando o sol começou a desaparecer no horizonte, a moça ouviu um rufiar de asas. Olhou para o céu e viu surgir onze cisnes voando apressadamente. Pousaram na terra e esconderam-se sob uma moita. Lúcia aproximou-se e ficou vigiando.
Quando os últimos raios do sol desapareceram, as penas dos onze cisnes caíram por terra e eles  transformaram-se em belos príncipes. Lúcia correu para eles, radiante de alegria. Reconheceram logo a irmã e cobriram-na de beijos e abraços. Que contentamento! Que felicidade!
A moça contou-lhes a sua triste história e eles narraram como tinham sido encantados pela cruel feiticeira. E o príncipe mais velho explicou: — Durante o dia, temos a forma de cisnes. Mas, logo que o sol desaparece, voltamos a ser homens. E por isso que temos sempre o cuidado de chegar à terra firme antes que anoiteça, pois, se estivéssemos voando nos ares, cairíamos de repente e morreríamos.
— Onde moram vocês? - perguntou Lúcia.
— Num lugar muito distante daqui, além dos mares. A viagem para lá é muito longa. Voamos dois dias sobre o oceano. No meio do caminho, só existe um rochedo isolado entre as ondas. É tão pequeno que nele só há espaço para ficarmos de pé, apertados uns contra outros. Quando o mar está agitado, cobre-nos de espuma da cabeça aos pés. Contudo, damos graças a Deus por termos aquele pequeno rochedo.
— Quantas vezes, por ano, podem vir até aqui ? - indagou a princesa.
— Somente uma vez. E só podemos demorar-nos onze dias. Chegamos há dez dias. Assim só temos um dia para ficar contigo.
A princesa e os irmãos ficaram a conversar durante muito tempo. Depois, vencida pelo cansaço, a moça adormeceu. Quando acordou, ouviu um forte bater de asas. Eram os irmãos que tinham voltado à forma de cisnes e que deviam passar o dia a voar.
Quando a tarde caiu, os cisnes voltaram e, assim que o sol desapareceu, retomaram a forma humana. Então, o mais velho dos irmãos disse para Lúcia:
— Já que te encontrámos, não queremos perder-te. Vamos passar a noite fazendo uma rede para podermos levar-te connosco.
E começaram logo a trabalhar. Apanharam uma porção de ramos e folhas para construírem uma rede resistente e macia. Pouco antes de romper o dia, o trabalho estava terminado.
Lúcia sentou-se na rede que foi elevada no ar pelo bico dos onze cisnes. Durante todo o dia, os pássaros voaram sem parar. Já estavam exaustos de carregar a rede, mas não desanimavam. A moça tremia só em pensar que poderia anoitecer, sem que chegassem ao rochedo perdido no meio do oceano. Mas, finalmente, quando os raios do sol começaram a desaparecer, a pequenina rocha surgiu no horizonte.
Quando a noite chegou com o seu manto de estrelas, a moça e os onze cisnes pousaram no rochedo. Os príncipes retomaram a forma humana. Tiveram de ficar estreitamente unidos para não caírem no mar. Assim que o sol nasceu os rapazes viraram, novamente, cisnes e bateram as asas, levando pelos ares a jovem princesa.
Após viajarem o dia inteiro, chegaram, finalmente, ao seu destino. Os irmãos viviam num penhasco, em frente ao mar, onde havia uma caverna, que era a sua morada. Dentro da caverna, que era muito limpa, viam-se camas de musgo bem arrumadas. Lúcia ficou ali com os irmãos que, nesse momento, acabavam de voltar à forma humana.
Depois de conversar longas horas com os príncipes, Lúcia resolveu descansar. Mas, antes de dormir, rezou, pedindo a Nossa Senhora que lhe ensinasse, em sonho, uma maneira de quebrar o encanto de seus irmãos.
Quando adormeceu, Nossa Senhora apareceu-lhe em sonho e disse-lhe:
— Poderás quebrar o encanto de teus irmãos. Mas, para isso, é preciso muita fé e perseverança. Existe perto deste penhasco, bem como nos cemitérios, uma urtiga que tem propriedades maravilhosas. Quando a apanhares, ficarás com as mãos inchadas e empoladas. Deves colher grande quantidade dessa planta e, com ela, tecerás onze túnicas. Quando estiverem prontas, atira-as sobre teus irmãos e, então, o seu encanto ficará quebrado. Voltarão, para sempre, à forma humana. Mas, para que tenhas êxito, é necessário que, enquanto estiveres tecendo as túnicas, não digas uma só palavra. Durante esse tempo, qualquer som que saia de tua boca ferirá como se fossem onze punhais cravados no coração de teus irmãos.
Quando Lúcia acordou, caiu de joelhos, agradecendo a Nossa Senhora o conselho que lhe dera. Depois, saiu da caverna e deu início ao seu trabalho. Começou a arrancar as folhas de urtiga que nasciam perto do penhasco. Quando o sol se pôs, voltaram os seus irmãos e perguntaram-lhe o que estava fazendo. Nem uma palavra de resposta. Os príncipes ficaram muito tristes, acreditando que a mudez da irmã era mais uma feitiçaria da madrasta. Mas, quando viram as mãos feridas e o trabalho que ela executava, sem parar, perceberam que fazia aquilo para quebrar o seu encanto. O príncipe mais moço pôs-se a chorar, beijando as mãos da irmã. E onde caíam suas lágrimas, desapareciam as empolas e as feridas.
De repente, ouviu-se o som de uma trompa de caça. Era o soberano daquele reino que caçava nas proximidades da caverna. Ao ver Lúcia, ficou deslumbrado com  a sua beleza. E resolveu levá-la para o palácio real.
Lá chegando, a princesa retirou-se para o rico aposento que lhe haviam oferecido. Havia trazido consigo o molho de urtigas e, por isso, continuou a trabalhar, febrilmente, durante a noite. Havia de libertar os seus irmãos!
Alguns dias depois, o rei não pôde resistir à paixão que o dominava e pediu a moça em casamento. Lúcia que estava enamorada do jovem soberano aceitou o pedido, mas não pôde dizer uma palavra. Sabia que, se o fizesse, causaria a morte dos seus onze irmãos.
Realizou-se o casamento com grande pompa. O rei supunha que a sua linda esposa fosse muda e por isso redobrava em seus carinhos para com a moça. Tinha pena da sua triste situação. E Lúcia cada vez amava mais o rei e lamentava não lhe poder contar a sua triste história.
A moça já tinha tecido várias túnicas, quando lhe faltou urtiga. Sabia que só podia encontrá-la no cemitério e, numa noite de luar, para lá se dirigiu.
Mas houve alguém que a viu sair do palácio e a seguiu. Era um fidalgo que odiava a rainha, pois pretendia ver a filha no trono. Por isso, quando viu a rainha entrar no cemitério, foi avisar ao rei, dizendo-lhe que a rainha talvez fosse uma feiticeira. O soberano ficou muito triste e resolveu vigiar a esposa.
Dias depois, tendo faltado, de novo, a urtiga, Lúcia tornou a ir ao cemitério. Mas desta vez, foi seguida pelo rei e outras pessoas. Viram-na aproximar-se de um túmulo, onde algumas aves de rapina estavam a devorar um cadáver. O rei não quis ver mais, julgando que a sua esposa era também uma bruxa repugnante.
Como não podia falar, Lúcia não pôde defender-se e, por isso, foi condenada a morrer na fogueira. Quando os onze príncipes souberam disso, já era véspera da morte da irmã. Correram ao palácio para falar ao rei. Os guardas disseram que não podiam acordar Sua Majestade. Os rapazes insistiram, suplicaram, ameaçaram e já se dispunham a lutar com a guarda real, quando romperam os primeiros raios de sol. Os príncipes desapareceram, e viu-se um bando de cisnes esvoaçando, desesperadamente, por cima das torres do palácio.


Chegou a hora da execução de Lúcia. A multidão enchia a praça principal da cidade. Daí a pouco, surgiu a moça numa velha carroça. Estava pálida e abatida, mas os seus dedos trabalhavam sem cessar. Já tinha, ao seu lado, dez túnicas prontas. Só faltava uma!
O carrasco quis jogar fora as túnicas, mas a moça olhou para ele com um ar tão suplicante que o homem não pôde recusar-lhe o último favor. A multidão, porém, cobriu-a de injúrias e avançou para despedaçar as túnicas.
Nesse momento, surgiram, fazendo grande barulho, onze cisnes lindíssimos, que começaram a dar bicadas terríveis nas pessoas que queriam atacar a carroça. Enquanto isso, a moça não parava de trabalhar. Finalmente, ficou pronta a última túnica.
Na ocasião em que o carrasco ia atirar Lúcia na fogueira, os onze cisnes  aproximaram-se para se despedir da irmã. Ela jogou, então, sobre eles as túnicas de urtiga. No mesmo instante, transformaram-se em onze príncipes de uma beleza deslumbrante. Estava quebrado e encanto!
— Agora já posso falar. Estou inocente!  - exclamou a moça. E contou ao rei, que estava presente na praça, a sua triste história.
A pena de morte foi logo revogada. O rei ficou louco de alegria e cobriu a esposa de beijos e abraços. Houve muitas festas no reino. E a todas assistiram os onze príncipes, que passaram a morar no palácio, junto da sua querida irmã.

Fonte : Contos Maravilhosos – Theobaldo Miranda Santos, Cia Ed. Nacional


TERROXOXÔ


Era uma mulher casada e dizia a toda a gente que o marido gostava muito dela e que se ela morresse o marido não casava com outra.
E uma vizinha dizia-lhe que não, mas a mulher não se convencia.
A mulher estava tão convencida do que dizia que a vizinha, já farta da conversa , um dia disse-lhe:
- Olhe, vossemecê finja-se morta e depois há-de ver!!!...
E assim foi. O marido veio para casa e encontrou a mulher morta.
E a vizinha veio logo a correr e disse ao homem que não lhe desse fezes que ela arranjava tudo. E puseram a mulher no meio da casa e a vizinha disse-lhe assim:
- Olhe vizinho, eu não posso cá passar a noite, mas mando para cá a minha filha para lhe fazer companhia para o vizinho não ficar só.
E fez uma cama para a filha ao pé da cama dele.
E o homem foi-se deitar primeiro e a vizinha mandou a mulher dele deitar-se na cama que era para a filha e por isso, o homem julgava que era a filha da vizinha quem estava deitada ao lado da sua cama
A mulher, pela noite adiante,  deu-lhe vontade  de fazer xixi e  pôs-se a urinar no bacio e ele então dizia-lhe assim:


- Ai minha alma, meu serafim
Que até no mijar fazes terlintintim;
Que a outra que o diabo levou
Quando mijava fazia terroxoxô.


A mulher acendeu a luz e deu-se a conhecer e só assim é que ela ficou sabendo o que os homens são!!

 e bendito louvado está o conto acabado.

terça-feira, 11 de março de 2014

O REINO DO LIMO VERDE

Era uma vez uma velha ambiciosa que tinha três filhas, cada qual mais feia. Perto da casa da velha, morava uma moça muito bonita que, apesar de pobre, andava com lindos vestidos e ricas jóias. Desconfiando de tanta riqueza, a velha visitava, frequentemente, a casa da moça para ver se descobria alguma coisa. Mas, por mais que procurasse, nada conseguia saber.
Resolveu então a sua filha mais velha tentar descobrir o segredo. Dirigiu-se à casa da moça e, depois de muitos rodeios, pediu-lhe para passar a noite em sua casa. A moça consentiu, mas, quando foi na hora de dormir, pôs no café da vizinha um remédio muito forte, que a fez dormir a noite toda, sem nada ver ou ouvir.
Enquanto ela dormia, bateu na janela da moça um belo papagaio. A moça abriu a janela, e a ave entrou no seu quarto, onde já estava preparada uma bacia com água. O papagaio tomou um banho, sacudindo as penas. Cada pingo que caía fora da bacia era um lindo diamante, que a moça recolhia e guardava. Quando o papagaio acabou de se banhar, transformou-se num belo príncipe. Depois de passar a noite com a sua noiva, o príncipe, logo que clareou o dia, transformou-se no papagaio e voou para longe.
A filha da velha, que nada vira, voltou para casa dizendo que era mentira o que se dizia da moça. Mas a velha, desconfiada, mandou a outra filha para passar a noite na casa da vizinha. Aconteceu então a mesma coisa: ela tomou café com remédio e roncou a noite toda.
Diante disso, a velha, sempre desconfiada, mandou a sua filha mais nova. Esta, que era muito esperta, quando lhe foi dado o café, fingiu que ia bebê-lo e entornou-o para um lenço que levava escondido. Deitou-se na cama e fingiu que estava a dormir. Pôde, assim, ver o que aconteceu durante a noite. Quando amanheceu, correu para casa e contou tudo à sua mãe.
A velha ficou cheia de inveja e, assim que anoiteceu, colocou no peitoril da janela da vizinha, uma porção de cacos de vidro e pedaços de navalha. Quando o papagaio chegou e foi passar pela janela ficou ferido, com o sangue a escorrer. A moça, espantada, correu para cuidar do papagaio, mas este, batendo as asas, exclamou:
— Ah! ingrata! Estou perdido! Nunca mais me verás, a não ser que mandes fazer uma roupa de bronze e andes com ela até ao Reino do Limo Verde, onde moro!
Dizendo isso, bateu asas e desapareceu no céu.
A moça ficou muito triste e compreendeu o motivo das visitas das filhas da velha. Mas não desanimou. Mandou fazer uma roupa de bronze, vestiu-a e saiu pelo mundo à procura do Reino do Limo Verde.
Depois de dois anos de viagem, chegou ao reino da Lua e perguntou a esta se lhe poderia dar notícias do Reino do Limo Verde. A Lua respondeu que nunca ouvira falar nesse reino, mas que talvez o Sol soubesse alguma coisa a esse respeito. A moça despediu-se e, na saída, a Lua deu-lhe de presente uma almofada de fazer rendas, com bilros e alfinetes de ouro.
A moça seguiu viagem e, depois de andar dois anos, chegou à casa do Sol. Este disse também que jamais ouvira falar no Reino do Limo Verde. Mas que talvez o Vento Grande pudesse dar alguma informação sobre ele. A moça despediu-se e, na saída, o Sol deu-lhe de presente uma galinha com pintos, todos de ouro, vivos.
A moça viajou mais dois anos e, afinal, chegou à casa do Vento Grande. Este ouviu o que ela disse e respondeu:
— Conheço o Reino do Limo Verde. Ainda ontem passei por lá.
A rapariga então suplicou ao Vento que a levasse até lá. O Vento Grande lhe respondeu: — Amanhã sobes comigo, e quando encontrares uma árvore muito grande e com uma grande copa, na frente de um palácio muito rico, seguras-te nos galhos, que é ali.
No dia seguinte, lá foi a moça montada no Vento Grande. Ao avistar a árvore, agarrou-se à mesma e desceu. E ficou, em baixo, imaginando o que havia de fazer para entrar no palácio e ver o príncipe.
Nesse momento, chegaram três rolinhas, pousaram na árvore e começaram a conversar.
Disse uma delas: — Não sabem? O príncipe do Limo Verde está para morrer.
A segunda perguntou: — O que será bom para ele?
E a terceira respondeu: — As feridas que ele tem no peito não saram mais; só se nos pegarem, tirarem os nossos corações, torrarem, moerem e deitarem o pó nas feridas.
A moça, que ouvira toda a conversa, armou um laço e apanhou as três rolinhas. Tirou-lhes os corações, torrou-os e fez um pozinho que guardou cuidadosamente. Em seguida partiu à procura do príncipe.
Fez tudo para entrar no palácio, mas não conseguiu. Então, tirou a almofada de ouro que a Lua lhe havia dado, e começou a fazer renda. Daí a pouco, veio passando uma criada do palácio que ficou maravilhada com a beleza da almofada. Foi contar o que vira à rainha e esta mandou perguntar à moça quanto queria pela almofada. E a moça respondeu: — Darei de presente a almofada, se me deixarem dormir no quarto do príncipe.
A rainha ficou ofendida e quis mandar prender a moça, mas a criada  disse-lhe: — Ora, minha senhora, o príncipe está tão doente que não conhece mais ninguém. Que mal faz que aquela tola durma no chão de seu quarto ?
A rainha, então, consentiu e ficou com a almofada de ouro.
A moça foi dormir no quarto do príncipe e logo na primeira noite lavou-lhe as feridas e pôs nelas o pó das rolinhas. Mas, desta vez, o rapaz não a reconheceu.
No dia seguinte, a moça foi, novamente, para debaixo da árvore e soltou a galinha e os pintos de ouro. Passou a criada e ficou admirada com o que viu. Foi correndo contar à rainha. Mandou esta perguntar quanto custava a galinha e os pintos. A moça respondeu que daria de graça aquelas preciosidades se a deixassem dormir duas noites no quarto do príncipe.
A rainha, a princípio, não queria deixar, mas, a conselho da criada, acabou consentindo. Na segunda noite, o príncipe melhorou muito e, na terceira, ficou completamente bom e reconheceu a moça. Abraçou-a, ternamente, e pediu-a em casamento.
E claro que a moça aceitou. Então, o príncipe apresentou-a aos seus pais como sua noiva. Dias depois, realizou-se o casamento com grande pompa. Houve muitas festas, não só no palácio, como em todo o Reino do Limo Verde.
Texto adapatdo
Fonte : Contos Maravilhosos – Theobaldo Miranda Santos, Cia Ed. Nacional

http://www.consciencia.org/o-principe-encantado-fabulas-infantis-maravilhosas

A MOURA TORTA

Era uma vez um príncipe que tendo chegado à idade de se casar, não encontrou nenhuma moça que lhe agradasse. O seu pai, que já estava muito velho, vivia muito triste por não ter o seu filho encontrado uma princesa para esposa. Receava morrer, deixando o filho solteiro. Como poderia ele governar o seu reino sem uma rainha e sem herdeiros ?
Aconselhou então o príncipe a visitar outros países. Talvez ele encontrasse, fora do reino, uma princesa capaz de lhe inspirar amor. O jovem aceitou o conselho do seu velho pai e, para não ser reconhecido, partiu vestido modestamente. Depois de muitos dias de viagem, quando se achava próximo de uma cidade, encontrou uma velhinha corcunda, carregando um feixe de lenha. O príncipe ficou com pena da pobre velha e ofereceu-se para carregar a lenha. Quando chegou à cidade, deu à velhinha uma bolsa cheia de moedas. A velha agradeceu a bondade do rapaz, abençoou-o e disse:
— Meu filho, não sei como retribuir o que fez por mim. Só tenho estas laranjas para lhe oferecer. Mas, quando as quiser comer, só as descasque perto de um lugar onde haja água corrente.
O príncipe guardou as laranjas e seguiu viagem. Depois de muito caminhar sob um sol abrasador, sentiu sede. Não encontrando água no caminho, lembrou-se das laranjas da velha. Tirou uma do alforge e começou a descascá-la. De repente, a laranja partiu-se ao meio e dela saltou uma linda moça, gritando: — Quero água! Quero água!
O rapaz ficou extasiado com a beleza da moça, mas como não houvesse naquele lugar uma gota de água, ela imediatamente desapareceu.
O príncipe ficou muito triste com o facto e seguiu viagem. Dias depois, atravessava ele um grande deserto, quando sentiu uma violenta sede. Lembrou-se, mais uma vez, das laranjas e, quando descascava uma, saltou do seu interior uma jovem, ainda mais bela do que a primeira, pedindo água pelo amor de Deus. O príncipe saiu correndo à procura de água, mas não conseguiu sequer uma gota. Quando voltou ao lugar, a linda moça havia desaparecido, sem deixar nenhum vestígio.
O príncipe ficou muito triste , mas prosseguiu a sua viagem. Depois de percorrer vários países, sem encontrar uma princesa que lhe agradasse, resolveu regressar ao seu reino. Quando se encontrava próximo do palácio do seu pai, sentiu uma sede irresistível. Resolveu comer a última laranja, mas, lembrando-se do que acontecera antes, andou, andou até encontrar um rio. Quando chegou às margens deste, parou e descascou a terceira laranja. Dela saltou uma jovem mais formosa do que as outras, pedindo um pouco de água. O príncipe correu e trouxe do rio um copo de água, que ofereceu à linda moça. Esta matou a sede e ficou desencantada. Por isso, não desapareceu.
Contou a sua história ao príncipe. Era filha de um rei muito rico, e havia sido transformada numa laranja pela sua madrasta, que era feiticeira. O príncipe ficou apaixonado pela moça. Pediu-a em casamento e ela aceitou. Resolveu então apresentá-la ao pai. Mas como a moça estivesse muito mal vestida, achou conveniente ir sozinho ao palácio buscar roupas bonitas e uma carruagem para sua noiva. Disse à princesa que subisse a uma árvore, que ficava na margem do rio, recomendando-lhe que não falasse com ninguém, durante a sua ausência. Feito isso seguiu, a toda pressa, para o palácio.
Mal o príncipe saiu, chegou à beira do rio uma negra muito feia, cega de um olho, a quem chamavam a Moura Torta. A negra abaixou-se para encher o pote no rio. Nisto, avistou o belo rosto da moça reflectido no espelho das águas. Ficou admirada de tanta formosura. Julgando que era o seu próprio rosto, exclamou:
— Ora essa! Uma moça tão bonita como eu, carregando água! Isto não pode ser! E atirou o pote contra as pedras, reduzindo-o a cacos. Depois disso, afastou-se toda orgulhosa, da beira do rio. Quando chegou a casa, disse à patroa que o pote tinha escorregado da sua mão e caído ao rio.
A patroa ficou aborrecida com a história, mas deu-lhe outro pote e mandou-a de volta ao rio. Quando a negra mergulhou o pote na água e viu novamente o rosto da moça, reflectido no rio, ficou outra vez convencida da própria beleza. Atirou o pote para longe e voltou para casa, inchada de orgulho. A rapariga escondida na árvore, ao ver a "pose" da Moura Torta, quase soltou uma gargalhada, mas conseguiu reprimir o riso e ficou à espera do noivo, que já estava tardando.

A patroa, quando viu a negra sem o pote, ficou furiosa. E ameaçou dar-lhe com ochicote, se ela voltasse para casa sem água. A Moura Torta, muito sucumbida, tomou de novo o caminho do rio, levando, desta vez, um caldeirão de ferro. Quando se abaixou para tirar água e viu, mais uma vez, a imagem da moça, ficou desesperada. Agarrou o caldeirão de ferro, que a patroa lhe havia dado, e começou a bater com ele nas pedras.
A princesa ao ver a cena, não se pôde conter e soltou uma boa gargalhada. A Moura Torta, espantada, olhou para cima e viu a moça na árvore. Compreendeu logo o que havia acontecido e disse:
— Ah! é você, minha pombinha? Que está fazendo aí nessa árvore?
A moça contou que estava à espera do príncipe, seu noivo. Diante disso, a negra subiu até onde estava a princesa e começou a conversar com a mesma. Elogiou os lindos cabelos da moça e pediu licença para penteá-los. A princesa, sem nada desconfiar, atendeu ao seu pedido. Quando a Moura Torta, que era feiticeira, pôs a mão na cabeleira dourada da moça, aproveitou um momento de distracção desta e enterrou na sua cabeça um alfinete mágico. Imediatamente a princesa se transformou numa pomba branca, que saiu voando pelo espaço.
A Moura Torta tomou então o lugar da jovem e ficou à espera do príncipe. Quando este chegou, numa carruagem lindíssima, trazendo ricos vestidos para a noiva, ficou desapontado ao encontrar, no seu lugar, uma negra feia e zarolha. A Moura Torta disse-lhe que tinha ficado assim devido ao sol que lhe queimara a pele e aos espinhos da árvore que lhe haviam furado olho.
O príncipe ficou muito acabrunhado, mas, como havia dado a sua palavra, levou a preta para o palácio. O rei quase morreu de desgosto quando conheceu a sua futura nora, mas ficou calado para não aborrecer o seu querido filho.
Começaram então os preparativos para o casamento. O príncipe enviou convites para todos os reis e príncipes dos países vizinhos. E a Moura Torta mandou fazer os mais belos vestidos e as mais ricas jóias. Mas quando os experimentava, ficava ainda mais feia e ridícula. Ninguém suportava a presença da horrível rapariga.
O jardineiro do rei estava a colher flores para o casamento, quando viu uma pombinha branca pousar numa roseira e dizer:
Hortelão, hortelão da real horta:
Como vai o rei com a sua Moura Torta?

O jardineiro contou o caso ao rei e este ao príncipe. O rapaz ficou intrigado com o acontecimento. Resolveu vestir a roupa do jardineiro e observar a pombinha.
No dia seguinte, à mesma hora, apareceu, de novo, a pombinha, que pousou num galho de roseira e exclamou:
Hortelão, Hortelão da real horta:
Como vai o rei com a sua Moura Torta?

O príncipe respondeu:
Come bem, dorme bem.
 Passa a vida regalada.
 Tão feliz e sossegado,
Como no mundo ninguém!

E acrescentou: — Põe o teu pezinho aqui, minha pomba.
 E a pomba respondeu: — Não, que o meu pé não foi feito para laço de barbante.
Dizendo isto, a pombinha bateu asas e fugiu.
O príncipe preparou então um laço de ouro. Também falhou. Preparou um laço de diamante. Desta vez, a pombinha deixou-se prender. O príncipe levou-a para o palácio e tratou-a com muito carinho.
A Moura Torta, vendo a pomba, nela reconheceu a princesa encantada. Disse ao príncipe que lhe desse a pombinha, pois desejava comê-la. O rapaz ficou com muita pena, mas não teve remédio senão atender ao pedido da noiva. Antes, porém, de entregar a linda ave, resolveu fazer-lhe um último carinho e passou a mão pela sua cabeça. Notou, com surpresa, que nela existia um pequeno caroço. . . Puxando-o, tirou o alfinete mágico. No mesmo instante, a pomba transformou-se na bela princesa que ele havia deixado na árvore.
O príncipe ficou radiante de alegria e ouviu da princesa a sua triste história. Ficou então sabendo da malvadeza da Moura Torta. A notícia espalhou-se pela cidade. O povo ficou tão indignado que correu ao palácio, tirou de lá a bruxa e queimou-a na praça pública. Depois, lançou as suas cinzas ao rio. O príncipe casou-se com a linda princesa. E o velho rei pôde então morrer, tranquilo e feliz, abençoando o filho, que o sucedeu no trono.
Fonte : Contos Maravilhosos – Theobaldo Miranda Santos, Cia Ed. Nacional
Conto adapatdo



MATA-PIOLHOS


Havia uma mulher que era muito teimosa e chamava ao marido  Mata-Piolhos.
O homem não gostava do nome, e dizia-lhe:
 Mulher, não me chames assim!
 Mas ela teimava.
Um belo dia, o homem  farto da sua teimosia, atou-lhe uma corda por baixo dos braços e meteu-a num poço, mas ela, enquanto ia pelo poço abaixo, ia dizendo:
 Mata-Piolhos, Mata-Piolhos, Mata-Piolho! 
E o homem sempre a fazê-la escorregar mais para o poço; já lhe ia a água quase no peito, e ela ainda:
 Mata-Piolhos, Mata-Piolhos, Mata-Piolhos! 
Foi mais para baixo, e, quando já lhe chegava a água à boca e não podia falar, então levantou os braços, e só com eles de fora fazia o gesto de quem mata-piolhos. 


MULHER TEIMOSA

Havia em tempos uma mulher tão teimosa, que por birra se meteu  numa ribeira, que levava muita água, e não dava passagem.
Caiu na ribeira, e morreu afogada.
No dia seguinte andou o marido à procura do cadáver da mulher; porém, em vez de seguir o leito da ribeira, acompanhando o curso da água, ele procurou o cadáver pela ribeira acima.
 Procura mal o cadáver, — disse-lhe um compadre — pois é natural encontrá-lo lá em baixo.

 Não, compadre. A  minha mulher era muito teimosa e mesmo depois de morta é capaz de caminhar contra a maré.

A MULHER TEIMOSA

Numa aldeia de Barcelos, havia um casal que andava sempre às bulhas, porque a mulher era muito teimosa.
Um dia; o homem trouxe para casa um queijo que comprou na vila, e, ao jantar, pô-lo na mesa e pediu à mulher uma faca para o cortar, mas a mulher, em vez de lhe trazer a faca, trouxe-lhe uma tesoura.
 Esta é boa! - disse o homem — Como é que eu posso cortar o queijo com a tesoura? Foi coisa que nunca se viu!
 Pois o queijo sempre se cortou com a tesoura !— disse a mulher.
 Que disparate! Com a faca é que sempre se cortou!! - disse o homem
 Pois é com a tesoura! — teima ela.
—É com a faca, mulher! – gritou o homem já zangado
E questionaram os dois por algum tempo, até que o homem, farto da teimosia, bateu na mulher, e perguntou em seguida:
 Então é com a faca, ou não?
 É com a tesoura, já disse! — teimou a mulher, apesar da coça que levara.
O homem enfureceu-se tanto, que, perdendo a cabeça, agarrou na mulher e foi a correr deitá-la ao rio, o Cávado, por sinal.
A mulher, que não sabia nadar, foi logo ao fundo como um prego, e o homem, ao vê-la desaparecer, ainda lhe disse cá de cima:
 Diz lá agora com que é que se corta o queijo! 
E viu-se então a mão da mulher aparecer por fora da água e mexer dois dedos, como a dizer que era com a tesoura.

Nem naquela altura deixou de teimar.

A FONTE DAS TRÊS COMADRES

Era uma vez um rei muito poderoso que teve uma enfermidade nos olhos e ficou completamente cego. Consultou então os melhores médicos do mundo, tomou todos os remédios aconselhados pela ciência, mas nada conseguiu. A sua cegueira parecia incurável. Um belo dia, apareceu, no palácio, uma velhinha a pedir esmola e, sabendo que o rei estava cego, pediu licença para lhe dirigir a palavra, pois desejava ensinar-lhe um remédio maravilhoso.
Conduzida à presença do rei, ela disse-lhe:
— Saiba Vossa Majestade que só existe uma coisa capaz de fazer voltar a sua vista: é banhar os seus olhos com água tirada da Fonte das Três Comadres. É muito difícil, porém, ir a essa fonte que fica num reino situado quase no fim do mundo. Quem for buscar a água deve entender-se com uma velha que mora perto da fonte. Ela conhece o dragão que guarda a fonte e sabe quando ele está acordado ou adormecido.
O rei ficou muito satisfeito com a informação da velhinha e recompensou-a com uma bolsa cheia de dinheiro.
Mandou, em seguida, preparar uma esquadra de vários barcos para conduzir o seu filho mais velho que deveria ir buscar a água da fonte milagrosa. Deu-lhe o prazo de um ano para cumprir a sua missão, aconselhando-o a não parar em nenhum porto para não se distrair do que devia fazer. O príncipe partiu, mas no meio da viagem, encontrou uma cidade onde havia muitas festas e lindas moças. Atraído pelos divertimentos, aí ficou a gastar todo o dinheiro que levava e contraindo grandes dívidas. No fim do prazo que lhe fora marcado, não seguiu viagem nem voltou ao reino do seu pai, o que causou a este um profundo desgosto.
Resolveu então o rei preparar outra esquadra de vários barcos a fim de que o seu segundo filho fosse buscar a água maravilhosa. O moço partiu, mas encontrou no seu caminho a mesma cidade onde se havia arruinado o seu irmão mais velho. Ficou também encantado pelas festas e pelas moças bonitas, e gastou tudo o que trazia, esquecendo-se da missão que o seu pai lhe confiara. No fim de um ano, ainda se encontrava nessa cidade, pobre e endividado.
O rei, ao saber da notícia do que acontecera ao seu segundo filho, ficou muito triste e desanimado. E perdeu a esperança de curar a sua cegueira. Mas o seu filho mais novo, que era ainda um menino, não se conformou com os acontecimentos e disse-lhe:
— Agora, meu pai, eu é que vou buscar a água. Garanto-lhe que hei-de trazê-la!
O rei procurou dissuadi-lo: — Se os teus irmãos, que eram homens nada conseguiram, que poderás tu fazer, meu filho ?
Mas, o pequeno príncipe tanto insistiu e rogou, que o pai acabou por ceder. E mandou preparar uma esquadra para a sua viagem. O jovem partiu cheio de esperança. Depois de muito navegar, encontrou a famosa cidade onde os seus irmãos já se achavam presos pelas dívidas que haviam contraído. O príncipe pagou as dívidas dos irmãos e conseguiu pô-los em liberdade. Estes tudo fizeram para dissuadir o rapaz de seguir viagem. Mas o príncipe nada quis ouvir e continuou, resolutamente, a sua jornada.
Ao chegar à região onde se encontrava a Fonte das Três Comadres, desembarcou sozinho, levando apenas uma garrafa. Seguiu logo para a casa da velhinha, que residia perto da fonte.
Esta ao vê-lo ficou muito admirada, dizendo: — Por que vieste aqui, meu netinho? Estás a correr um grande perigo! O monstro que vigia a fonte é uma princesa encantada que tudo devora. Se quiseres, realmente, apanhar água da fonte, aproveita a ocasião em que o monstro estiver adormecido. Quando ele estiver com os olhos abertos, podes aproximar-te sem receio. É sinal de que está a dormir. Mas se o encontrares com os olhos fechados, foge depressa, pois ele estará, de certeza, acordado.
O príncipe prestou bastante atenção aos conselhos da velha e seguiu para a fonte. Quando lá chegou, viu que a fera estava com os olhos abertos. Verificando que ela estava a dormir, o príncipe aproveitou o momento para encher a sua garrafa com a água milagrosa. Mas, quando se ia a retirar cuidadosamente, o monstro acordou e lançou-se, com fúria, sobre o rapaz. Este puxou da espada e travou uma luta terrível com a fera. Depois de muito lutar, conseguiu ferir o horrendo bicho e fazer o seu sangue correr. Nesse momento, o monstro desencantou-se, transformando-se numa belíssima princesa. O príncipe ficou extasiado, pois nunca tinha visto uma moça tão formosa.
Ela então disse-lhe: — Prometi que havia de me casar com aquele que me desencantasse. Portanto, dentro de um ano, virás buscar-me. Se não o fizeres, irei à tua procura.
E para que ela pudesse reconhecer o jovem príncipe, quando fosse buscá-la, a princesa deu-lhe um pedaço do seu vestido.
Contente e feliz, o príncipe partiu de volta à sua terra. Ao passar pela cidade onde se encontravam os seus irmãos, convidou-os para embarcar na sua esquadra, a fim de que pudessem regressar ao seu país. Os irmãos aceitaram o convite. O rapaz havia guardado a garrafa com a água milagrosa dentro de uma mala. Os seus irmãos armaram, então, um plano para lhe roubarem a garrafa e se apresentarem ao pai como seus salvadores. Para isso sugeriram, ao príncipe, dar um banquete no barco para comemorar o facto de ele ter conseguido o maravilhoso remédio. Durante a festa , os irmãos, aproveitando-se da boa fé do jovem príncipe, conseguiram que ele bebesse muito vinho e adormecesse profundamente. Tiraram-lhe do bolso a chave da mala, abriram-na, tiraram a garrafa com o remédio e substituíram-na por outra garrafa cheia de água do mar.
Quando a esquadra atracou no porto da sua terra, o príncipe foi recebido com grande alegria e muitas festas. Mas, quando ele colocou nos olhos do pai a água que supunha ser da fonte maravilhosa, o velho soltou um grito de dor, devido ao sal do mar, e continuou cego. Os dois irmãos traidores acusaram então o príncipe de impostor e declararam que eles é que tinham ido buscar a água milagrosa. Dizendo isso, banharam com a mesma os olhos do rei que recobrou a visão.
Houve então grandes festas e banquetes no palácio e o jovem príncipe foi condenado à morte. Mas os soldados encarregados de degolarem o príncipe, ficaram com pena do rapaz e  deixaram-no na floresta. O príncipe ficou tão desgostoso que perdeu o amor à vida. Um lenhador malvado encontrou-o, caminhando como um louco, no meio da mata. Vendo que ele não reagia, fez dele seu escravo, obrigando-o a trabalhar, sem descanso.
Um ano depois, chegou a ocasião em que o rapaz devia ir casar com a princesa, conforme havia combinado na Fonte das Três Comadres. Como ele não aparecesse, a princesa ficou preocupada. Mandou então aparelhar uma poderosa esquadra e partiu para o reino do príncipe. Chegando lá, deu ordem ao comandante da esquadra para avisar o rei de que ele devia enviar-lhe o filho que fora ao seu reino buscar um remédio e lhe prometera casamento. Caso o noivo não viesse ao seu encontro, ela ordenaria à esquadra para fazer fogo sobre a cidade. O rei ficou apavorado e mandou o seu filho mais velho apresentar-se à princesa, supondo que ele fosse o noivo.
Mas a princesa, ao vê-lo disse: — Grande mentiroso, onde está o sinal do nosso reconhecimento?
Ele, que nada possuía, ficou calado e voltou para terra envergonhado.
Nova intimação e foi ter com a princesa o segundo filho do rei. Repetiu-se a pergunta anterior e o príncipe nada respondeu. A princesa mandou então que os canhões da sua esquadra fossem preparados para bombardear a cidade. O rei ficou aflitissimo, com a certeza de que a capital do seu reino seria arrasada, pois havia mandado matar o filho mais moço. Nesse momento, surgiram os dois soldados encarregados de executar o jovem príncipe, que confessaram ao rei que não o tinham degolado. Saiu toda a gente à procura do príncipe e foi prometido um grande prémio a quem o encontrasse.
O lenhador que o tinha escravizado ficou muito assustado quando soube que ele era filho do rei. Mais do que depressa, colocou o rapaz, que estava muito magrinho e enfezado, às costas e levou-o ao palácio. O príncipe foi então lavado e vestido com lindas roupas. O prazo que a princesa tinha concedido já estava a terminar e, quando os canhões iam começar a bombardear a cidade, o rapaz correu ao encontro da princesa, sendo logo reconhecido por esta, devido ao pedaço do vestido que levava na mão. A princesa abraçou-o chorando de alegria. Seguiram então para o reino da princesa onde se casaram no meio de festas que duraram seis meses. O rapaz tornou-se rei de um dos países mais belos e ricos do mundo. Os seus irmãos traidores foram expulsos do reino do seu pai e condenados a pedir esmola até ao fim da sua vida.


O FATO NOVO DO REI / O REI VAI NU


Era uma vez um REI que viveu há muitos anos. Gostava tanto de roupas novas e bonitas que gastava todo o seu tempo e dinheiro a vestir-se. Não ligava importância ao exército, não ia ao teatro, não andava de carruagem por entre o povo a não ser quando queria exibir uma fatiota nova. Tinha um casaco diferente para cada hora do dia; e, tal como se ouve dizer de outros soberanos: "Está em Conselho!", no seu caso a resposta seria: "O imperador está no quarto de vestir!"
A vida era bastante alegre na cidade em que ele vivia. Estavam sempre a chegar forasteiros, e um dia apareceram dois indivíduos com um ar suspeito que diziam ser tecelões. Mas, segundo eles, o tecido que fabricavam não só era extraordinariamente belo como tinha ainda propriedades mágicas: mesmo quando transformado em peças de vestuário, era invisível para todas as pessoas que não desempenhassem bem as suas tarefas ou que fossem particularmente estúpidas. — Excelente! — pensou o rei. "Que bela oportunidade para descobrir quais os homens do meu reino que não devem estar nos lugares que ocupam e quais são os espertos e os estúpidos! Pois é, aquele material tem de ser tecido e transformado em roupa imediatamente!"
E deu aos dois malandros uma grande quantia de dinheiro para começarem a trabalhar.
Assim, os dois patifes montaram dois teares e agiram como se estivessem a trabalhar afanosamente, mas a verdade é que não havia nada nos teares. Pouco depois, estavam a pedir o melhor fio de seda e de ouro, que meteram nos seus próprios bolsos, continuando a mover os braços diante dos teares vazios pela noite dentro.
Ao fim de algum tempo, o Rei pensou: "Gostava realmente de saber como vai aquilo!"
Mas, quando se lembrou de que o tecido não podia ser visto pelas pessoas estúpidas ou incompetentes no seu trabalho, sentiu-se um tanto embaraçado em ir ele próprio. Não que tivesse quaisquer dúvidas quanto às suas capacidades, é claro, mas achou que talvez fosse melhor mandar alguém primeiro. Afinal de contas, toda a gente na cidade sabia dos poderes especiais do tecido; toda a gente estava ansiosa por descobrir até que ponto o vizinho era estúpido ou incompetente.
— Já sei! Vou lá mandar o meu velho e honesto ministro! — decidiu. — É o homem indicado, o mais sensato possível, e ninguém pode queixar-se da maneira como desempenha as suas funções.
Então, o bom velho ministro foi à sala onde os dois malandros estavam a fingir que trabalhavam nos teares.
—"Que Deus me ajude!" pensou ele, abrindo os olhos cada vez mais. "Não consigo ver nada!!!."
Mas guardou o pensamento só para si.
Os dois vigaristas pediram-lhe que se aproximasse; não achava ele que os padrões eram lindos e as cores deliciosas? E gesticulavam diante dos teares vazios. Mas, embora o pobre velho ministro espreitasse e olhasse fixamente, continuava a não ver nada, pela simples razão de que não havia lá nada para ver.
"Céus!", pensou. "Serei mesmo estúpido? Nunca pensei que fosse, e o melhor é que ninguém o pense! Serei mesmo incompetente a desempenhar as minhas funções? Não, não posso dizer que não vejo o tecido."
— Então, não o acha admirável? — perguntou um dos falsos tecelões, continuando a mexer as mãos. — Ainda não disse nada!
— Oh, é encantador, perfeitamente maravilhoso — disse o pobre velho ministro, olhando atentamente através dos óculos. — O padrão, as cores... sim, tenho de dizer ao imperador que os acho notáveis.
— Bem, isso é muito animador — disseram os dois tecelões, apontando-lhe os pormenores do padrão e as diferentes cores utilizadas.
O velho ministro ouviu atentamente, de modo a poder repetir tudo ao imperador. E foi o que fez.
Os dois impostores então pediram mais dinheiro e mais fio de seda e de ouro; disseram que precisavam disso para acabarem o tecido. Mas tudo o que o rei lhes deu foi direitinho para os seus bolsos e nem um ponto apareceu nos teares. Apesar disso, continuaram a agitar afanosamente os braços diante das máquinas vazias.
Mais tarde, o Rei mandou outro honesto funcionário para ver o andamento do trabalho e saber se o tecido estaria pronto em breve. Aconteceu-lhe a mesma coisa que ao ministro; olhou e tornou a olhar, mas, como não havia nada para ver senão os teares vazios, nada foi tudo o que ele viu.
— Não é um belo tecido? — perguntaram os aldrabões.
E ergueram o tecido imaginário diante dele, apontando para o padrão que não existia.
"Eu acho que não sou estúpido", pensou o funcionário. "Se calhar não sou a pessoa indicada para o cargo que desempenho. Bem, nunca pensaria tal coisa! E o melhor é que ninguém o pense!"
Por isso, emitiu várias apreciações sobre o tecido que não conseguia ver e disse aos homens que gostava muito das cores e do desenho.
Quando o Rei lhe perguntou o que é que ele achava do tecido disse-lhe  que o achava magnífico, e único, nunca ninguém tinha tido um tecido assim.  O Rei ficou ainda mais contente.
As notícias sobre aquele tecido fantástico depressa se espalharam pela cidade. E então o Rei decidiu ir vê-lo ainda nos teares. Assim, com alguns servidores cuidadosamente escolhidos — entre os quais os dois honestos funcionários que já lá tinham estado —, foi à sala de tecelagem, onde os malandros faziam as suas palhaçadas, tão activos como sempre.
— Que tecido esplêndido! — exclamou o velho ministro.
— Veja o padrão, majestade! Observe as cores! — disse o outro funcionário.
E apontavam para os teares vazios, porque estavam certos de que as outras pessoas viam o tecido.
"Isto é terrível!" -  pensou o Rei -  "Não vejo nada! Serei estúpido? Serei incompetente como Rei? É assustador pensar uma coisa dessas." Então, disse em voz alta:
— Oh, é encantador, encantador! Tem toda a nossa aprovação!
Acenou com ar satisfeito para os teares vazios; nunca iria admitir que não via lá absolutamente nada.
E os ministros que o acompanhavam também olhavam fixamente, todos eles secretamente alarmados por não serem capazes de ver um único fio. Mas, em voz alta, fizeram eco com o Rei:
— Encantador, encantador!
E aconselharam-no a utilizar o esplêndido tecido para o novo fato real que teria de vestir num grande cortejo a realizar dentro em pouco.
— É magnífico e tão fora do vulgar... — era o que se ouvia de todos os lados.
E o Rei condecorou os dois tecelões impostores com uma roseta para porem nas botoeiras dos casacos e o título de Funcionário Imperial do Tear.
Durante toda a noite anterior ao dia do cortejo, os dois aldrabões fingiram trabalhar, com dezasseis velas à sua volta. Toda a gente podia ver como eles estavam atarefados, tentando acabar a tempo o fato novo do imperador. Fingiam tirar o tecido dos teares, cortavam o ar com grandes tesouras de alfaiate, cosiam e tornavam a coser com agulhas sem linha. Por fim, anunciaram:
— O fato do Rei está pronta!
O Rei foi vê-lo com os seus cortesãos mais nobres, e os dois aldrabões ergueram os braços como se estivessem a levantar alguma coisa.
— Aqui estão as calças — disseram eles. — Aqui está o casaco e aqui está a a capa com a cauda... — e por aí fora. — São leves como espuma; pelo toque, dir-se-ia que não se tem nada vestido, mas a beleza está precisamente aí.
— Sim, claro... — disseram os acompanhantes do Rei, embora continuassem sem ver nada, porque não havia nada para ver.
— Se Vossa Majestade quiser fazer o favor de tirar a roupa que tem vestida, teremos a honra de o ajudar a vestir esta diante do espelho grande.
O Rei despiu-se e os dois aldrabões fingiram entregar-lhe as roupas novas, uma peça de cada vez. Depois, com os braços à volta da sua cintura, fingiram ajustar a cauda, num toque final.
O Rei virou-se e deu uma volta em frente do espelho.
— Que elegante! Que bem que assenta! — murmuravam os ministros - Que tecido tão rico! Que cores magníficas! Já alguma vez tinham visto uma coisa tão magnífica?
— Majestade — disse o mestre-de-cerimónias —, o dossel já está lá fora.
O dossel cobriria o Rei durante o cortejo.
— Bem — exclamou o Rei —, estou pronto. Assenta realmente muito bem, não acham?
E tornou a dar umas voltas em frente do espelho, como quem se admira pela última vez. Os ministros que tinham de pegar na ponta da cauda baixaram-se, como se erguessem alguma coisa do chão, e levantaram as mãos diante de si. Não iam deixar o povo pensar que eles não viam nada.
E assim o Rei foi caminhando no imponente cortejo, sob o esplêndido dossel, e toda a gente nas ruas ou nas janelas exclamava:
— Que ar magnífico tem o Rei! E as roupas novas... não são maravilhosas? Olhem só para a cauda! Que elegante!
O facto é que ninguém queria admitir que não via roupas nenhumas, porque isso significaria que eram estúpidos ou então incompetentes no seu trabalho. Nenhum dos belos fatos do Rei tinha sido tão admirado até então.
Foi quando se ouviu claramente uma voz espantada de criança:
— O Rei não leva nada vestido! O Rei vai nu!!!!
— Estes inocentes! As coisas ridículas que dizem! — exclamou o pai da criança.
Mas um murmúrio começou a crescer no meio da multidão:
— Aquela criança diz que o Rei não leva nada vestido... o Rei não leva nada vestido! E daí a pouco toda a gente repetia: — O Rei vai nu!!!!P
Por fim, até o próprio Rei achou que eles deviam ter razão, mas pensou para si próprio:
"Não posso parar, senão estrago o cortejo."
E lá foi andando com um ar cada vez mais orgulhoso, enquanto os cministros continuavam a segurar uma cauda que não existia.
Hans Christian Andersen